sábado, 21 de abril de 2012

ARTE - brasilidade e germanidade – 005



ARTE e GERMANIDADE

“Canto o hino da pátria que permite ganhar o pão para os meus filhos”
José SIMON professor rural de uma comunidade germânica ao longo do Estado Novo


Fig. 01 –  Na imensa obra intitulada  “ Revoluções Burguesas” realizada entre 1983-7, e exposta no  Panorâmio Bad Frankenhausen, o pintor  Werner TUBKE 1929-2004 recapitula visualmente a história da- germanidade com base - na Arte

Evidente que não existe arte alemã, nem brasileira ou ocidental. Arte é um fenômeno universal do gênero humano. O que se poderia afirmar que o ENTE HUMANO possui diversas maneiras de SER e de se expressar. No entanto a Arte está muito próxima ao ENTE humano. Nesta intimidade constituiu-se uma das pontes deste ENTE inatingível com o mundo tangível nas suas formas físicas e sociais. Assim a obra de arte constitui-se como um dos  seus índices mais autênticos e continuados deste SER. 



Fig. 02 –  Albrecht DÜRER (1471-1528) foi um dos mais expressivos representantes do que se estuda aqui como  germanidade na Arte. O seu retrato “Pai do Artista” (1497) mostra o seu domínio do desenho, do detalhe a cor sóbria é coerente com a escolhas plásticas de um artista que opera  coerentemente com o se tempo e ao mesmo tempo. Esta obra é, portado, um  dos índices que WORRINGER descreve como características da arte e do artista nórdico.

Uma obra de Arte 100% original constitui um trabalho condenado a não ter observadores. O seu público potencial não possui meios de entender e valorizar a mensagem do seu autor. Esta obra de Arte terá recepção zero. No contraponto a esta solidão, o artista está mergulhado numa cultura que o ultrapassa em todos os sentidos e direções. O mínimo que ele necessita perceber é de que as suas competências e os seus limites são aqueles do seu tempo e seu lugar. A obra que ele produz é o resultado de um projeto no qual o seu papel é escolher elementos do repertório da cultura física e mental que cerca o seu projeto. Esta mesma cultura do autor a receberá em primeira mão esta obra física.  Esta mesma cultura extrairá os elementos simbólicos que geraram esta obra.
Cabe o aviso: inclusive esta narrativa, em relação à arte alemã, possui como referencial o que perceptível ao seu autor a partir do seu repertório originário da brasilidade. 


Fig. 03 –  A obra de Mathias Gothart GRUNEWALD (c.1470-1528) Altar de Isenheim é decorrência e de toda uma tradição técnica e mental desenvolvido ao longo do período gótico e em contato e distinção na do Renascimento Italiano de sua época. Esta  RESSURREIÇÃO coloca no seu centro a figura humana e reflete a liberdade da germanidade na Arte tanto nos meios técnicos como a forma inédita do grande ponto de interrogação e própria para exercer a abstração pela composição da forma plástica desta obra.

 A cultura na qual está mergulhado o autor da obra de arte, ou narrativa em relação à ela, possui competência para sustentar coerentemente esta obra física de forma autônoma e fora do seu autor e de iniciar a sua peregrinação pelo mundo afora - ou impedi-la. Os elementos físicos da obra fornecem, para os seus observadores, a mentalidade que animou o seu autor gerando uma recepção continuada e que transcende, no tempo e no espaço. Esta obra física possui, assim, condições de se abrir aos sentidos dos seus semelhantes.

Fig. 04 –  ALTDORFER Albrecht 1480-1538 A paisagem como tema autônoma de uma obra de arte possui, nesta obra,  na cultura ocidental uma das suas primeiras realizações preservadas pelos seus observadores.  A imagem está no lugar de algo Assim a germanidade desta obra de Arte exerce o seu papel de abstração da Natureza reinterpretada e reduzida a duas dimensões e que ela busca superar pela perspectiva geométrica, recém criada e esta obra pela disposição plástica dos elementos a realiza a perspectiva visual.

O teórico alemão Wilhelm WORRINGER (1881 -1965) distinguiu na sua obra “Abstraktion und Einfuelung” (1908) uma das estruturas pelas quais os elementos físicos e mentais se organizam conforme o lugar e o tempo. Para ele estão, de um lado, as regiões quentes do planeta. Nestas regiões ensolaradas o modo de SER (Einfuelung - natureza) é das culturas mediterrâneas, ou tropicais. Nestas regiões quentes o artista vive epidermicamente e se expressa diretamente e sem grandes medições, reflexões intelectuais ou rebuscados filtros de sua sensibilidade.
Fig. 05 –  O artista e arquiteto  Karl Friederich - SCHINKEL (1781 – 1841) é mais conhecido pela evocação da cultura grega clássica. Contudo  nesta sua  obra  “catedral com torres” ele evoca a germanidade na Arte com base de obras góticas que estão retomadas na conclusão da Catedral de Colônia que será o símbolo da unificação  política dos reinos germânicos na forma da Alemanha contemporânea unificada. Esta retomada gótica será uma das expressões plásticas da tendência romântica na artes. Esta tendência irá se disseminar pela cultura ocidental do século XIX e da qual o Brasil possui expressões por todo o seu território nacional.

Já no pólo oposto coloca-se o modo de agir do SER adaptado ao frio nórdico que ele denominou “Abstraktion”. Este SER possui mais tempo para se fazer mais reflexivo, guardar e elaborar mentalmente aquilo que concerne á Arte. Além disto ele está mais disposto a acumular, arquivar e a refletir.
No seu contraste o SER mediterrâneo vive entregue usufruir o instante presente dado, ao descarte e sem se preocupar com grandes elucubrações filosóficas e também com estéticas mais abstratas.
Fig. 06 –  O TRÍPTICO de VEIT STOSS (1447-1533), elaborado  entre 1477-1484, é a sua obra prima. Hoje em Varsóvia na Polônia. Esta obra  constitui uma das autênticas obras do gótico tardio e uma das expressões da germanidade na Arte pela sua detalhada e minuciosa elaboração formal e técnica. Contrasta por esta elaboração com as obras mediterrâneas do Renascimento Italiano no qual a FORMA é tecnicamente menos afeiçoado aos detalhes e ás minúcias técnicas e formais.

Miguel Ângelo percebeu e distinguiu a germanidade como aquele cuidado no detalhe e na descrição visual exaustiva nas artes plásticas. Nas manifestações mediterrâneas ele apontava para as grandes formas, sem detalhes e dadas ao usufruto direto do observador
A germanidade não se isola da cultura eslava, saxã, do norte da França e dos países baixos (flamengos). De outra parte a germanidade não coincide precisamente com o Estado Alemão atual. Assim austríacos, boêmios, suíços ou holandeses podem ser incluídos nas manifestações com características próximas do modo de SER da germanidade.

Fig. 07 –  O “Monumento a Batalha da Nações  de 1813,   erigido em  LEIPZIG no inicio do século XX e inaugurado em 1913. O Völkerschlachtdenkmal possui 91 metros de altura e salas comemorativas no seu interior. Ele celebra a culminância da unificação dos Estados (Länder) germânicos que formaram na década de 1870 o Estado Alemão.  A sua forma externa permite especular em relação ao modelo do monumento erguido uma década depois em São Leopoldo para comemorar o centenário da imigração alemã. A inauguração daquele de LEIPZIG precedeu a catástrofe alemã da derrota da I Guerra Mundial ficou tristemente famoso pelo uso que a propaganda nazista fez dele.  Contudo com a sua ampla com base sugere o poder originário desta nação e a  germanidade na Arte pela força da cor sombria e pelas fantasmagóricas figuras humanas do seu exterior e interior.

Assim a manifestação que ganhou maior relevo e coerência nesta cultura da foi a ARTE GÓTICA. Especialmente quando se expressa em miniaturas, na pintura de cavalete, escultura e mesmo na sua verticalidade arquitetônica como nas catedrais de Colônia, Ulm e Viena.
Esta manifestação não impediu a Albrecht DÜRER (1471-1528) aderir e transitar no espaço do Renascimento italiano. Contudo o mestre do altar de Issenheim Mathias GRÜNEWALD (1470-1528) , Veit STOOS (1447-1533) mantém a coerência no detalhe e ênfase na descrição minuciosa. Assim também procedem nas suas obras o pintor Albrecht ALTDORFER (1480-1538) e uma série subsequente de pintores maneiristas. Altdorfer também cultivou a paisagem em si mesma. Esta busca da “paisagem por ela mesma como tema de uma pintura”, constituiu motivo e tema de um grande número de pintores flamengos.
Fig. 08 –  Caspar David FRIEDERICH (1774-1840) na obra “Arvores e Lua” ,1824,  óleo 19.5 c 25.5 cm expressa a germanidade na Arte com os detalhes minuciosamente observados e desenhados. A noite, o mistério e fantasmagórico das regiões frias nórdicas e predispõe autor e o seo observador a dar livre curso à “ABSTRAKTION”

No início da História contemporânea os artistas germânicos do Iluminismo deixaram se seduzir pelas artes de Roma e da Grécia Clássica. A obra de Johann Joachim WINCKELMANN (1717-1768) encontrou uma série de artistas e depois arqueólogos que consagraram a suas vidas a esta estética. Desta preocupação derivaram as tendências Neo-Clássicas.  O Romantismo colocou a Idade Média e sua arquitetura, escultura e música diante destes artistas.
Fig. 09 – Adolph von MENZEL (1815-1905) elaborou, entre 1872-1875, a pintura “Modernos Ciclopes”. Nesta imagem ele mostra o acúmulo de gente, matéria prima e tecnologia que evidencia triunfo da era industrial e da linha de produção que sustentaram materialmente a germanidade na Arte, a partir do século XIX.

Estas tendências neo-góticas estavam em plena expansão quando os imigrantes deixaram a Alemanha.  A conclusão da catedral de Colônia, em 1884,  marcou fisicamente a unificação da Alemanha e ponto alto das tendências românticas. O Rio Grande do Sul recebeu o  mestre João GRUNEWALD (1832-1910)e que havia trabalhado no canteiro de obras (bauhaus) da Catedral de Colônia [http://www.koelner-dom.de/home.html ]
Fig. 10 –  Adolph von MENZEL (1815-1905) na sua obra “Praça das Ervas de Verona” (1884), evidencia a profunda germanidade da sua Arte. Esta se materializa pelas cores sóbrias, a atenção aos incontáveis detalhes e pela materialidade da tinta que usa. Esta materialidade da tinta continua a ser explorada por Anselm Kieffer, nascido em 1945, em suas obras “matéricas”.

O Expressionismo encontrou na Alemanha terreno fértil que estava marcado pelas contradições culturais, econômicos, sociais e políticas que precederam, acompanharam a derrota na I Guerra Mundial e as suas consequências. Contra esta dilacerante tendência estética tentou-se erguer a arte das formas puras construtivas e sem figuração propostas pelos mestres da BAUHAUS.
Fig. 11 –   Lyonel FEININGER (1871-1956) na pintura “O Motim”  (1910) este pintor norte-americano profundamente identificado com a  germanidade na Arte busca o caricato, o estranho e insólito.Foi professor da Bauhaus no período áureo (1912-1932) desta instituição germânica proveniente do movimento DEUTSCHER WERKBUND (1907) e associado ao sentido pragmática da arte desenvolvido no século XIX na Inglaterra sob a designação Art and Crafts.

A reconstrução pós 1945 teve na arte uma das formas para a Alemanha dizer a si mesma para o que veio e mostrar ao mundo este seu sentido. A Documenta de Cassel foi, a partir de 1955, uma das instituições que acolheu, estudou e divulgou mundo a fora este novo modo de SER da arte alemã, sua presença no mundo e o seu respeitoso diálogo e interação com as demais culturas e tendências estéticas.
Fig. 12 –  Joseph BEUYS (1921-1986)  num fotograma de das suas últimas ações desenvolvidas em 1986. Nesta ação procurava chamar atenção para individualidade e autonomia do artista e como tal na busca de um espaço no qual este EU possa ser sujeito ativo e autônomo capaz da sanção de sua ação moral, estética e social.
 Este piloto de um caça alemão da II Guerra Mundial, caído numa aldeia russa e salvo pelos seus inimigos tornou-se um verdadeiro xamã da germanidade na Arte. Coerente passou a desenvolver ações e movimentos que tinham como fonte e repertório objetos e situações do seu tempo e lugar. Com esta abertura procurava a medicina das suas próprias feridas e aquelas da identidade alemã destroçados pelas ideologias, as guerras e a divisão (1945-1990) da Alemanha em duas.

A queda do Muro de Berlim trouxe para o convivia da Alemanha unificada os representantes da Escola de Leipzig que se sucederam e estão, em2012,  na sua 3ª geração.
O que deve destacar, no mundo germânico, é o mundo conceitual que sempre envolveu e acompanhou atentamente as obras de arte. Este mundo conceitual compre a disposição germânica de acumular, de arquivar e de refletir sobre o fenômeno e a obra de arte que o teórico Worringer lhe apontara em 1908. De memória e possivle nomear alguns destaques como Alexander Gottlieb Baumgarten(1717-1762 criador de termo “Estética”, Georg Wilhelm Friederich Hegel (1770-1831), Alois Riegl (1858-1905 com a sua concepção de “Kunstwollen”,  Carl Jacob Christoph Burkhardt (1818-1897), Aby Warburg (1866-1929) e o seu instituto.

Fig. 13 –  A DOCUMENTA de CASSEL. Iniciada em 1955,  pôs em prática a oportunidade  de o artista alemão e das demais nacionalidades de conviverem e trocarem sentimentos, projeto e realizações provenientes dos cinco continentes. Se de um lado era institucional, e continua sendo, do outro lado preserva e promove a individualidade e autonomia do artista.  Este EU é sujeito ativo, responsável e autônomo e como tal na busca de um espaço no qual capaz da sanção de sua ação moral, estética e social. Esta imagem fotográfica mostra esta individualidade e diferenças a partir das roupas e das formas de vestimenta. Certamente mostra a germanidade na Arte competente para se renovar coerente com o seu tempo e lugar.
 A Escola de Frankfurt, iniciada em 1923, retomou as concepções de Arte partindo das questões de Karl Marx (1818-1883). Estes, e muitos outros,  acolheram, deram suporte como historiadores, críticos e fizeram fluir esta produção intelectual na indústria cultural. Mas todos põem em relevo a autonomia do artista e a primordial idade da obra de arte. Caso contrário podem ocorrer derrapagens conceituais, tendo efeitos desastrosos como ocorreu com a “arte degenerada”, onde um líder afirmava “arte alemã é clara”. Nada mais equivocado se forem contempladas as escuras obras germânicas de todos os tempos.

Fig. 14 –  Werner TUBKE (1929-2004) num detalhe do imenso mural “Revoluções Burguesas” - realizado entre 1983-7 e para o qual foi construído o Panorâmio Bad Frankenhausen -  trata as imagens das individualidades que se destacaram na germanidade na Arte e na Cultura. O tratamento formal desta obra é coerente com esta mesma germanidade tanto no minucioso detalhamento, pela cor negra dos contornos de chumbo dos vitrais góticos e pela abstração temática de uma cena possível de acontecer apenas nas artes, na imaginação,  e não no mundo empírico e fotográfico.

Se quisermos ser fiéis a pensamento de WORRINGEN temos de admitir que o imigrante alemão foi afetado no transplante para as regiões mais quentes do paralelo 30 Sul, proveniente que das frias regiões do paralelo 50 Norte. Assim este ENTE HUMANO TRANPLANTADO DO SEU MEIO, enfrentou neste novo clima outra realidade nas suas maneiras de SER e de se expressar. Em todo caso o fato deste deslocamento não deixou de chamar a atenção, em 1834, quando o viajante francês Arsène Isabelle escreveu:
“Minha admiração não foi menor ao ver, quase sob o trópico, uma nação das regiões polares, conservando hábitos, seus costumes, sua vida ativa, e dando origem a uma geração que deve um dia mudar a face do país”.

Fig. 15 –  Em pleno século XXI o jovem pintor Michael TRIEGEL, nascido em 1968, interpreta em  2008, o tema da “Paisagem visual” em técnica mista e no formato 47 x 64 cm. Ele é considerado como a 3ª geração da Escola de Leipzig  e uma das muitas e variadas expressões da germanidade na Arte que continua a sua trajetória pelo tempo e espaço. Estas novas gerações que acreditam em si mesmas tendo por fundamento o rico variado e único legado e patrimônio estético germânico de todos os tempos.

Em resumo é necessário admitir, que Arte germânica expressa o ENTE de sua Nação em cada nova época e em circunstâncias únicas e inéditas. A Alemanha continua um projeto coerente com o seu tempo e próprio espaço. O imigrado, desta região, possui ainda os traços e as forças de sua origem, porém que evoluem em outra nação e circunstâncias distintas daquelas dos seus antepassados.

                                            FONTES
WORRINGER,  Wilhelm (1881 - 1965).  Abstraccion y naturaleza.  1.ed. 1908.  México :  Fondo de Cultura   Econômica, 1953. 137p.
 ____.   La esencia del estilo gótico.(1ª ed. 1911) Buenos Aires: Nueva Visión,   1957. 144p

RETÀBULO DE EISENHEIM - GRÜNEWALD

ALBRECHT DURER

O RETRATO INDIVIDUAL no PERÍODO COLONIAL BRASILEIRO

Johann Joachim WINCKELMANN

MUSEU da ESCOLA ALEMÃ

EXPRESSIONISMO ALEMÃO

BAUHAUS  como INSTITUIÇÂO ALEMÃ
ANSELM KIEFER

MEMÓRIA VISUAL da IMIGRAÇÂO ALEMÃ

DOCUMENTA de CASSEL

MICHAEL TRIEGELL

ACADEMIA de ARTES VISUAIS de LEIPZIG

WERNER TÜBKE
ELOGIO de um ITALIANO ao APOIO da CULTURA pelo GOVERNO ALEMÃO



A presente postagem possui objetivos puramente didáticos
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