segunda-feira, 7 de março de 2011

ISTO NÃO É ARTE - 08

Convém: abrir e ler

http://profciriosimon.blogspot.com/2010/10/isto-nao-e-arte-01.html

para compreender os objetivos deste post.

O novo pelo novo, não é arte ou a

MORTE da Arte pelas CONEXÕES CORTADAS.

A MORTE da ARTE ocorre pela INTERRUPÇÃO ou CORTE com as circunstâncias nas quais o ARTISTA atua. Após algum tempo é possível conferir a morte pela falta dos SINAIS VITAIS da ARTE dos quais uma OBRA sempre é portadora. Com este desfecho ela é remetida ao mundo do TRABALHO, para a inutilidade e a obsolescência, senão ao museu como farsa, crime e horror.

Para constituir-se numa obra Aristóteles distinguia (1973: 343 114a 10 ) “toda a arte está no que produz, e não no que é produzido”. Entende-se aqui “no que produz” como quem produz e “no que produz” em o que. Esta produção migra para os universos constituídos pelos documentos falsos ou falsificados e condenados à obsolescência - típica da Natureza - caso ocorra a mínima desconexão - entre quem faz e aquilo que ele produz -

A desconexão entre quem faz e aquilo que ele produz, pode decorrer da inabilidade, desatenção ou onipotência daquele que se julga artista. Mas também pode ser imposta pelas circunstâncias culturais, pela falta ou excesso destes recursos, o que é mais comum. Num exemplo gritante de excesso de recursos é fornecida pela comparação e distinção entre o grau de civilização atingida pelo indígena pré-colombiano. Na comparação e distinção as obras produzidas pelos indígenas dos rudes desertos do Peru pendem a favor destes. Enquanto a produção dos indígenas - satisfeitos com a sua sorte nas dadivosas florestas e campos do Brasil - é rudimentar .

A industria cultural e o artesanato, em geral, não alcançam a conexão - vital e coerente - entre “no que produz, e no que é produzido”. As forças vivas do campo das artes produzem apenas para o mundo do trabalho ao tentar trabalhar de forma cega, heteronômica e desconectada, no âmbito da industria cultural e do artesanato. São carentes de alma própria os produtos do artesanato rotineiro e da indústria cultural destinado à obsolescência. Alma - ou ânimo - que as vivificam e sustentam como obra de arte na ausência - física e pessoal - de quem os produziu.

O poder originário da arte emerge, para nossa atenção, quando se busca este ânimo, ou alma, da arte. Neste poder originário da arte os artistas primitivos possuem um papel na conexão entre “no que produz e no que é produzido”. Um notável exemplo encontra-se na história das origens do movimento estético, que depois se denominou Renascimento Italiano. O pintor Giotto de Bondone (1266-1337) retomou o projeto da conexão com a pintura entendida como tinta, pincel sobre a superfície. Desviava-se do artesanato e dos produtos culturais já obsoletos. Tempo obsoleto no qual o ícone bizantino era produzido e estava preso a normas estéticas estranhas e diferentes daqueles das circunstâncias do poder originário vigente da época de Giotto.


http://pt.wikipedia.org/wiki/Giotto_di_Bondone

Fig. 01 _ LAMENTAÇÂO GIOTTO di BONDONE (1266-1337)



Giotto constituiu o seu projeto pessoal ao retomar os humildes meios pictóricos contra arte bizantina e contra o gótico no seu apogeu. Arte bizantina que tinha transformado as pinturas dos ícones em jóias, o gótico desproporcional ao humano. Contudo o projeto pessoal de Giotto não se constituiu apenas uma rebelião pela rebelião. No centro do seu projeto pessoal estava a criatura humana. Esta ganhava uma oportunidade para conectar a sua sensibilidade, inteligência e vontade por meio destes humildes meios pictóricos e passava a constituir-se em uma proporção como “medida de todas as coisas”.


http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%8Dcone

Fig. 02 _ ICONE BIZANTINo RUSSO- Nossa Senhora de Kazan


Os ícones bizantinos eram trabalhados em filigrana de ouro, matérias e pedras preciosas e raras e caras. Valiam mais pelo seu material do que criatividade do seu artista. Enquanto os materiais da pintura de Giotto podem ser encontrados em qualquer ferragem. Todo o valor de uma pintura de Giotto, e dos seus seguidores, decorria da originalidade e da conexão com o ato criativo de que elaborou com estes materiais comuns e baratos.

O Renascimento condenava, nos góticos, a desproporção humana e a busca da eternidade alienante do aqui e do agora.


http://www.fineart-china.com/htmlimg/image-40128.html

Fig. 03 _ FUGA ao EGITO (1304-1305) - detalhe deGIOTTO di BONDONE (1266-1337)


Ainda que as obras de Giotto pareçam ingênuas e bisonhas para o leigo atual - movido pela onipotência e fartura de informações - elas instalaram uma série cultural de desafios coerentes entre quem produz e o que produz. O projeto - destes desafios - foi aceito pelas gerações de pintores subseqüentes. O apogeu deste projeto irá evidenciar se, na sua plenitude, nas obras de Leonardo da Vinci, de Rafael Sanzio e Miguel Ângelo, entre tantos outros.

https://peregrinacultural.wordpress.com/tag/leonardo-da-vinci/

Fig. 04 _ MONA LISA (1503-1506) Leonardo da Vinci (1452-1919)


Leonardo da Vinci, dois séculos após Giotto, aceitou o estatuto do mestre. Consciente do seu tempo e meio e o autor da Mona Lisa impôs livremente, a si mesmo e a sua arte, os procedimentos e os materiais de Giotto. Os resultados - da escolha destes humildes materiais e procedimentos - foram capazes de revelar, para todas as gerações subseqüentes, todo o esplendor e maturidade cultural da inteligência, destes dois florentinos. Esta coerência cultural transforma os artistas nos autênticos e universais testemunhos do seu tempo e lugar. As filas dos seus observadores da Mona Lisa, as páginas e tinta usada na publicação das análises, vindas de todos os saberes humanos, são índices da conexão coerente entre quem produziu e o que produziu.

Imagine-se se o Leonardo tivesse optado pela volta ao estatuto do ícone Bizantino. Toda a sua inteligência e sensibilidade estariam bloqueadas pelas rígidas normas desta arte milenar que jogariam a sua obra para a heteronomia de uma série já sem a conexão vital com as suas circunstâncias.

A busca desta coerência na conexão - com o se tempo e lugar - continua em plena vigência. Os artistas de vanguarda estão sondando o seu próprio meio e o seu tempo. Para simples exemplo desta conexão cita-se a artista americana Taryn Simon (1975). Ela criou uma das suas obras ao registrar, em fotos, o contrabando do movimento no Aeroporto de Nova York, entre os dias de 16 ate 20 de novembro de 2009.

http://www.nytimes.com/interactive/2010/07/30/magazine/20100801-taryn-simon-contraband.html#/-8/

Fig. 05 _– Contrabado de bolsas legítimas Verssagge registro em nov. 2009 de SIMON Taryn (1975)

Clique sobre as imagens

Fig. 07 _– Peças de contrabado registro em nov. 2009 de SIMON Taryn (1975)

Veja as imagens em http://www.nytimes.com/interactive/2010/07/30/magazine/20100801-taryn-simon-contraband.html

A obra Taryn SIMON (1975) possui múltiplas conexões com a vida contemporaneidade. Possui um projeto focado, limitado e exeqüível pela artista. A ação desenrola-se com toda atenção da sua autora e sem desvios de seu projeto. Tanto os textos, as imagens e o material, fornecidos para a mídia, permitem a reversibilidade a todo o processo abrangido por este projeto. Os meios numérico-digitais juntam-se e tudo isto e são direcionados para à interação com os observadores. Evidente que o tempo necessita conferir e fornecer o seu aval para transformar este projeto em obra que mantém vivo as conexões entre a artista, a sua obra e as suas circunstâncias.


http://www.shafe.co.uk/art/Richard_Hamilton-_Just_What_is_it_that_Makes_Today-s_Homes_So_Different-_So_Appealing-_(1956)-.asp


Fig. 06 _ O que torna os nossos lares tão atrativos 1956 HAMILTON Richard 1922


O artista Richard Hamilton registrou em 1956 o consumismo de sua época. Na sua origem tinha sentido e conexão com o consumismo obsessivo. O tema da obraO que torna os nossos lares tão atrativos” é sugerido por manequins de vitrine de loja comercial rodeados por produtos de desejo da época. O procedimento da colagem vulgarizou-se. Passado meio século o próprio artista não se copiou e nem atualizou o tema. Isto seria fácil demais: bastaria ir a uma vitrina de qualquer loja de departamentos para conferir as diferenças entre 1956 e 2011. Taryn Simon retomou apenas o conceito deste projeto de consumismo na sua época . Contudo o realiza num ambiente em que poucas atuaram ou tiveram coragem de atuar: num terminal de um aeroporto dos mais movimentados do mundo e no departamento de controle de importados.

Uma das funções do estudo da História da Arte é não repeti-la voluntária ou involuntariamente. A repetição sempre é uma farsa e o que nasce desta farsa é algo já consumido por outra cultura. Este é o terreno do KITSCH que se vale do predomínio da EMOÇÃo sobre a RAZÂO. Este desequilíbrio compromete a conexão entre quem produz e o que é produzido.


Nos seus extremos e na sua totalidade absoluta, tanto a EMOÇÃo como a RAZÂO aniquilam a vida, o novo e o autêntico. Entre estas forças extremas é necessária a homeoastase. Se a RAZÂO, no seu extremo, esteriliza a reprodução do novo, a EMOÇÂO aposta e joga no caos todos os meios artísticos. Por si mesmas, tanto a EMOÇÂO como a RAZÂO, levados aos seus extremos não produzem o continuum da arte, e muito menos a sustentam. Elas são incapazes, por si mesmas, manter as conexões entre quem produz, o que produz e quem recebe a obra.



A exposição ao publico dos corações partidos, no balcão e nas janelas da mídia, são cenas de um romantismo adolescente. Historicamente esta exposição encontrou inicialmente guarida e divulgação na obra “Os Sofrimentos do Jovem Werther” (1774) de Goethe. Contudo “esta obra produziu mais suicídios dos que o número de letras do seu texto” conforme os seus detratores e depois denominado “Efeito Werther”. Evidente este não era o objetivo do seu autor e nem o da sua obra de arte. Assim o autor de “Fausto” (1806) evolui em direção aos clássicos universais Esta evolução foi acompanhada e descrita por Cláudia Valladão de Matos[1] (USP, 2009)



A conclusão que se pode chegar é que o mero capricho da mudança pela mudança, a ruptura pele ruptura e o novo pelo novo não é arte.

Aliás a Semítica ensina, há muito tempo, que aquilo que é 100% original não possui a menor oportunidade para ser decodificado e se isola como um ato hermético e sem a possibilidade de constituir um único observador que seja.



Citados


ARISTÓTELES (384-322). Ética a Nicômano. São Paulo: Abril Cultural, 1973. 329p.


Bolsas Verssagge ver http://grupoalmibar.com/index.php


EFEITO WERTHER

. http://teorias-do-crime-um-seminario.blogspot.com/2007/03/o-efeito-werther-e-o-suicdio-importncia.html





[1] MATTOS, Cláudia Valladão de “ÉCFRASE Goethe, o Eikones de Filostrtao e a resistência aos românticos São Paulo : Revista da USP nº 71 nov. 2009 versão impressa ISSN 0103-9989

http://www.revistasusp.sibi.usp.br/scielo.php?script=sci_serial&lng=en&pid=0103-9989&nrm=iso

Disponível em

http://www.revistasusp.sibi.usp.br/scielo.php?pid=S0103-99892006000400012&script=sci_arttext


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